13º Domingo do Tempo Comum – C
1Rs 19,16b.19-21; Sl 15; Gl 5,1.13-18; Lc 9,51-62
26 de junho de 2022

Homilia

A subida de Jesus a Jerusalém é um dos grandes temas do Evangelho de Lucas. Todos os domingos, de hoje até o final do ano litúrgico, leremos um longo trecho de seu Evangelho narrando esta lenta e muitas vezes dramática ascensão.

O Evangelho de hoje começa com estas palavras:

“Estava chegando o tempo de Jesus ser levado para o céu. Então ele tomou a firme decisão de partir para Jerusalém”.

Lc 9, 51

Esta pequena frase, que parece narrar uma entrada elegante e inocente, é na realidade de uma intensidade de fazer estremecer, se a destrincharmos um pouco. É preciso dizer que os tradutores, em qualquer idioma, tiveram dificuldade em transmitir toda a força das expressões gregas usadas por Lucas: “Estava chegando o tempo…” diz nossa tradução. Mas Lucas diz, literalmente: “Como os dias estavam prestes a se cumprir…” Esta é a mesma expressão que Lucas usou em seu relato do nascimento de Jesus: “Como estava prestes a se cumprir o tempo em que ela (Maria) deveria dar à luz…” (2, 1). Chegamos assim a um momento decisivo, ao fim dos tempos, ao nascimento definitivo de Jesus. E este nascimento definitivo, este fim dos tempos, será a sua morte. Nossa tradução diz: “Estava chegando o tempo de Jesus ser levado para o céu. Então ele tomou a firme decisão de partir para Jerusalém”. Isso traduz muito bem o significado da frase grega. Mas uma tradução literal seria muito mais feroz, e traduziria: “Como se aproximava o tempo em que ele ia partir desta vida” (ἀνάληψις [análēpsis] pode ainda ser traduzido por “partida”, “morte” ou “ser eliminado”).

E qual é a atitude de Jesus em relação a este fim brutal de seu ministério, que já se designa diante de si? Ele não somente está ciente disso, mas ele encara olho a olho a situação e vai resolutamente em direção ao objetivo: “Ele tomou a firme decisão – literalmente, manifestou no semblante a destemida resolução – de partir para Jerusalém”.

A missão de Jesus na terra terminará em um fracasso retumbante, chamado Cruz. Muito cedo Ele toma consciência disto. Mas isso não o impede de ser totalmente fiel à sua missão e aceitar resolutamente o fracasso. Nisso ele nos ensina muito. Mesmo na ordem puramente natural, a vida humana normalmente não é uma longa série de sucessos. É feito, em todos os níveis, de uma alternância de sucessos e fracassos. A pessoa que amadurece e cresce, ao longo de sua vida, não é aquela que nega seus fracassos, mas aquela que sabe administrá-los, ou seja, aceitá-los claramente pelo que são, que sabe aprender com eles, sabe por um ponto final em um capítulo, depois virar a página com calma e começa outro capítulo. A tentação nunca falta, seja de não reconhecer o fracasso como tal e fingir que o considera um sucesso, ou de deleitar-se de forma masoquista com o sofrimento. A atitude de Jesus é bem diferente: ele se enveredou por um caminho e não se desviará dele mesmo sabendo que Jerusalém matará até o último dos profetas assim como matou muitos outros.

Jesus deve, ao longo do caminho, formar tanto a comunidade de discípulos que o acompanha quanto aqueles que se apresentam a Ele. Ele também deve atravessar a Samaria. Ora, sabemos que havia grande tensão e animosidade entre os Judeus, cuja capital religiosa era Jerusalém, e os Samaritanos, cuja capital religiosa era Samaria. Ele envia seus discípulos para preparar sua chegada entre os Samaritanos, o que também será para eles um fracasso, pois eles sem dúvida anunciaram a chegada do grande profeta que estava subindo a Jerusalém para lá ser coroado rei-messias! Eles ainda não tinham entendido nada. Sua missão é um fracasso e eles não apenas culpam os Samaritanos por isso, mas também querem se vingar enviando sobre eles o fogo do céu! – Quantas vezes culpamos os outros por nossas falhas pessoais e queremos puni-los por isso?

No caminho – provavelmente ainda na terra dos Samaritanos – chegam a Jesus duas pessoas que querem segui-lo e, entre os dois, há um que o próprio Jesus convida a segui-lo. Essas pessoas não são nomeadas, como normalmente são os discípulos que Jesus chama. Trata-se, portanto, de figuras “tipos”: quando a Bíblia não dá nomes – como “o discípulo que Jesus amava” – ela se refere a cada um que a lê, a cada um de nós, dependendo das circunstâncias de nossas vidas.

Ao primeiro, que diz: “Eu te seguirei para onde quer que fores” (57), Jesus não responde algo como: “Bravo, bem-vindo ao meu grupo!”. Ele nem sequer lhe faz uma pergunta. Ele apenas esboça para ele os requisitos daquilo que ele deseja fazer; e faz isso simplesmente descrevendo o que ele mesmo vive: “o Filho do Homem não tem onde repousar a cabeça” (58). Ao outro que lhe diz: “Eu te seguirei, Senhor, mas deixa-me primeiro despedir-me dos meus familiares” (61), ele responde: “Quem põe a mão no arado e olha para trás não está apto para o Reino de Deus” (62).

Mas, entre estes dois, há um terceiro, aquele que o próprio Jesus chama. Como em todas as outras vocações semelhantes, Jesus simplesmente diz: “Segue-me”. Ele não diz, como nossos superiores costumam fazer hoje em dia: “Sabe, eu pensei que talvez você pudesse considerar aceitar essa responsabilidade… talvez você gostaria de pensar sobre isso por algumas semanas”… Não. Jesus simplesmente diz “Segue-me”; e o sentido deste “segue-me” é iluminado por todo o contexto desta subida para Jerusalém. Ele sobe a Jerusalém para ali morrer. Isso dá um enorme peso à expressão “segue-me”.

Caríssimos irmãos e irmãs, cada um de nós recebeu um chamado pessoal. Nossa jornada normalmente será feita de uma mistura de sucessos e fracassos, de satisfações pessoais e de decepções. Nós somente cresceremos para a plenitude da Vida através deste caminho, do simples de caminhar, na medida em que, como Jesus, nosso olhar e nosso rosto se voltarem de forma decidida e irrevogável para a meta, aconteça o que acontecer.

Dom Martinho do Carmo, osb

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