Santíssimo Corpo e Sangue de Cristo – Ano C
Gn 14,18-20; Sl 109(110); 1Cor 11,23-26; Lc 9,11b-17
16 de junho de 2022

Saber crescer.

“Quando eu era criança, falava como criança, sentia como criança, pensava como criança”.

1Cor 13,11

Eu mesmo, quando era criança, me perguntava se mais tarde conseguiria falar como adulto, raciocinar como adulto, aprender uma profissão, me defender, tudo saber e compreender, encontrar meu lugar neste mundo, ser respeitado e apreciado… tantas perguntas, e às vezes medos, que habitam o coração das crianças… e que, portanto, precisam ser tranquilizadas. Porque há muitas coisas que acontecem muito naturalmente. Por exemplo, desde as primeiras horas de nossa vida, é vital saber como receber o leite materno. Não é algo evidente, mas os bebês sabem como fazê-lo. Eles sabem “assimilar” o leite materno, torná-lo seu, digeri-lo para transformá-lo em energia vital para o seu crescimento.

Os “homens espirituais” poderiam até desprezar esses aspectos iniciais da vida, como a necessidade de comer. Vejam o que os Doze apóstolos disseram a Jesus:

“Despede a multidão, para que possa ir aos povoados e campos vizinhos procurar hospedagem e comida”.

Lc 9, 12

Mas Jesus então os convida a não desprezar esta necessidade básica de abrigo e de alimento:

“Dai-lhes vós mesmos de comer”.

Lc 9, 13

Mas eu volto a esta palavra “assimilar”: a criança “assimila” o leite materno. Depois ela será instruída a assimilar as lições da escola, para torná-las suas. No verbo “assimilar” há a palavra “similar”: a criança deve tornar-se similar, semelhante, “igual” ao leite que vem da mãe ou às lições que estuda.

Sim, similar ao leite que vem de sua mãe e no qual recebe muita energia vital (e amor!). Pois a vida, a energia deste mundo, deve se estabelecer e se desenvolver na criança. O mesmo acontece com as lições que ela aprende na escola, onde ela deve ser semelhante e estar em sintonia com tudo o que compõe a vida humana: língua, história, cultura, religião… E, de fato, pelo Batismo as crianças tornam-se semelhantes a Jesus, assimiladas e semelhantes Àquele que se torna seu irmão, seu Salvador e seu Deus.

Saber comungar.

Antes da Primeira Eucaristia, geralmente, as crianças se perguntam qual é o gosto da hóstia, qual é o gosto do vinho no cálice… Por trás dessa aparente curiosidade ingênua está uma importante pergunta: “Será que vou saber comungar?”; “Saberei receber Jesus, pão da vida, que – diz a catequista – vem à minha boca e ao meu coração para ali fazer morada, para que eu me torne seu amigo?” Ora, diferentemente dos outros aprendizados, não é uma é questão de instinto de bebês ou de docilidade da criança estudiosa. Saber comungar é uma questão de fé.

Pois o “pão vivo descido do céu” não é alimento carnal, mas alimento espiritual que supõe que somos verdadeiramente amigos de Jesus, que estamos em profundo relacionamento de fé com ele. Jesus já pedia esta confiança aos seus discípulos:

“’Mandai o povo sentar-se em grupos de cinquenta’. Os discípulos assim fizeram, e todos se sentaram. Então Jesus tomou os cinco pães e os dois peixes, elevou os olhos para o céu, abençoou-os, partiu-os e os deu aos discípulos para distribuí-los à multidão. Todos comeram e ficaram satisfeitos”.

Lc 9,14-17

Eis como os cinco mil comungantes souberam “assimilar” o pão da vida, “e ficaram satisfeitos”. Eles assimilaram um alimento que não é mais o leite da infância, mas o pão dos viajantes que caminham em direção à Pátria que o Batismo lhes abriu: o céu. Este pão da vida, a carne do Filho do Homem, é o pão dos peregrinos que são os cristãos. Um pão que nos faz “semelhantes” Àquele que tanto nos amou, e que sempre cuida de nós. A cada comunhão nos tornamos um pouco mais como Jesus que sofreu por amor a nós, que está vivo, ressuscitado, glorificado em sua alma e em seu corpo humano (que, aliás, foi nutrido com o leite de Maria). Somos assimilados a ele, unidos à sua vida divina, “divinizados” como bons filhos e filhas de Deus que nos tornamos pelo Batismo.

Saber oferecer-se na Eucaristia.

Depois de alguns anos, as crianças iniciadas na Primeira Eucaristia recebem o sacramento da Confirmação. A fonte que brotou em seus corações no Batismo se tornará nelas transbordante e fecunda para sua felicidade e a de todos os seus entes queridos na Igreja. Isso crescerá com e através delas, no poder do Espírito Santo.

Para elas, como para nós, é claro que sempre será necessário receber Jesus na comunhão, como todos os adultos na fé. Mas todos que se tornaram (ou querem tornar-se) adultos na fé terão que se oferecer a Jesus na Eucaristia. Conosco e com São Paulo, deverão um dia dizer:

“Quando cheguei a ser homem, desisti das coisas próprias de criança. Porque, agora, vemos como em espelho, obscuramente; então, veremos face a face. Agora, conheço em parte; então, conhecerei como também sou conhecido”.

1Cor 13,11b-12

Amém!

Dom Martinho do Carmo OSB

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