Homilia para o XVII Domingo do Tempo Comum – A,
proferida a 26 de julho de 2020
por Dom Martinho do Carmo OSB

1Rs 3,5.7-12; Sl 118; Rm 8,28-30; Mt 13,44-52

Saudação inicial

O Reino de Deus! O que isso quer dizer? Nos últimos domingos Jesus tem nos convidado a refletir sobre isso comparando-o a uma semente que só produz frutos abundantes se for acolhida em uma boa terra. O Reino de Deus é o trigo bom que é confrontado com o joio. O Reino de Deus não triunfa por meio da violência, mas sim por meio de uma discreta força interior como a do fermento dentro da massa. E hoje Jesus nos diz que o Reino é esse Tesouro, essa pérola preciosa pela qual tudo é sacrificado.

Homilia

Caros irmãos e irmãs. O Reino de Deus[1] hoje é comparado a “uma rede lançada ao mar e que apanha peixes de todo tipo. Quando está cheia, os pescadores puxam a rede para a praia, sentam-se e recolhem os peixes bons em cestos e jogam fora os que não prestam.” (Mt 13,47-48). Ora, mas é preciso aqui o olhar aguçado do pescador, deste homem que conhece muito bem o seu ofício, para distinguir, quando a rede está cheia, o peixe que merece ser recolhido e aquele que é não serve para o consumo ou para a venda. Um homem sem experiência não saberá fazer a triagem. Talvez ele até consiga julgar o tamanho do peixe ou sua aparência, mas muito provavelmente rejeitará, sem discernir, muitos outros bons peixes.

O Reino dos Céus também é hoje comparado a “um comprador que procura pérolas preciosas. Quando encontra uma pérola de grande valor, ele vai, vende todos os seus bens e compra aquela pérola” (Mt 13,45-46). Mas aqui é igualmente preciso um olhar treinado de um bom profissional para identificar a pérola rara que vale a pena ser comprada. Ora, para quem é desprovido de experiência, seria imprudente vender tudo o que se possui para comprar uma pérola que pode ser valiosa, mas que também pode ser uma imitação barata. É preciso ser louco para arriscar tal operação quando não há absoluta segurança de não se estar equivocado. Igualmente, aquele que tem certeza de que não cometerá um erro, aquele que tem suficiente experiência para comprar uma pérola rara, mas, ainda assim, prefere ficar com suas antigas riquezas muito menos preciosas, este também é realmente insensato!

Na conclusão deste trecho do evangelho, Jesus diz que “todo o mestre da Lei, que se torna discípulo do Reino dos Céus, é como um pai de família que tira do seu tesouro coisas novas e velhas” (Mt 13,52). Como discípulos do Reino, conhecemos aquilo que nos é importante. Conhecemos esse tesouro escondido no campo que é o mundo, mas continuamos apegados a outros tesouros. Cremos que a vida de Deus, como uma fonte escondida, nos sacia todos os dias, mas também bebemos tão frequentemente de outras fontes. Experimentamos que Deus é nossa alegria e nossa força. Aspiramos a essa felicidade que supera todas as outras riquezas. Mas raramente estamos dispostos a vender todos os nossos bens para adquirir esse Bem que supera todos eles.

Somos discípulos do Reino, mas permanecemos sendo pobres escribas. Tiramos de nosso tesouro coisas novas, mas preferimos as coisas velhas. Mantemos nossos velhos valores, nossas velhas riquezas, nossos velhos hábitos. Talvez porque essa nova vida que Jesus nos oferece parece-nos por demais contra a natureza! Amar nossos inimigos, abençoar aqueles que nos amaldiçoam, não reivindicar nossos direitos, dar sem esperar nada em troca, isso tudo não nos é natural. Logo, não nos é natural seguir o Evangelho, não nos é natural receber o Reino de Deus como nosso único tesouro… Nossos velhos costumes são difíceis de morrer. Sentimos que a felicidade está do lado do Evangelho, do lado da vida que Deus nos oferece. Tentamos seguir o Evangelho, mas tropeçamos. Conhecemos a fonte, mas ela muitas vezes permanece oculta demais para que possamos arriscar preferi-la ao invés de todo o resto. Assim, na verdade, não temos suficiente conhecimento daquilo que nos é realmente importante a tal ponto que isso nos leve a deixar nossos valores antigos.

Mas Jesus nos coloca uma Palavra fundamental, uma verdadeira “Revelação” (o verdadeiro significado da palavra “Apocalipse”): “Assim acontecerá no fim dos tempos: os anjos virão para separar os homens maus dos que são justos, e lançarão os maus na fornalha de fogo. E aí haverá choro e ranger de dentes.” (Mt 13,49-50). Uma mensagem desesperadora? Claro que não! Para quem possui fé e esperança, essa Palavra de Deus significa que no fim do mundo, os falsos valores que nos prendem na infelicidade deste mundo serão queimados. Não estaremos mais constantemente divididos entre a lei do mundo e a Lei de Deus. No fim do mundo, Deus separará em cada um de nós aquilo que é bom e daquilo que não vale nada. E o que não vale nada, mas que nós, de forma insensata, valorizamos, será finalmente lançado ao fogo. Seremos libertos disso para sempre. E então não haverá mais choro e ranger de dentes…

Mas não é preciso esperarmos até o fim do mundo. Dia após dia, durante nossa existência terrena, onde lutamos para discernir o que não vale nada e o que é, verdadeiramente, uma fonte de felicidade, Deus já vem nos libertar. Todas as vezes que, diante de Deus, reconhecemos nossa falta de discernimento, ele nos enche de seu Espírito de Sabedoria.

Àqueles que reconhecem que nada valem, porque que são incapazes de renunciar aos falsos valores do mundo, Deus lhes revela que eles, na verdade, é são esse tesouro escondido que Ele mesmo procura no campo do mundo. Deus, em seu Filho Jesus Cristo, vendeu tudo o que possuía; ele renunciou a todas as riquezas do céu e da terra, a fim de adquirir essa pérola preciosa que cada um de nós representa para Ele. Deus conhece, mais do que nós mesmos, aquilo que realmente nos interessa! E, sem precisar esperar pelo fim do mundo, se quisermos, Ele se encarrega de lançar na fornalha de fogo todos os bens de pouco valor, os peixes que não prestam, e toda maldade que sonda nossas vidas. Irmãos e irmãs, o lugar que o Evangelho chama de “Reino de Deus” está presente e Jesus o indica: “O reino de Deus está no meio de vós”. Mas, ao mesmo tempo, esse reino deve ser esperado e procurado: “Buscai primeiro o Reino de Deus e sua justiça”. Que o Espírito Santo nos ajude a respeitar as verdadeiras proporções, os verdadeiros valores e, especialmente, a renunciar a tudo que é perverso! Que nessa luta diária aprendamos a responder ao Amor de Deus, transformando-nos assim pouco a pouco à Imagem de Seu filho. Que Ele ocupe o primeiro lugar em nossas vidas, que Ele mesmo seja este tesouro cujo valor é incalculável! Para que então, comece a brilhar em nós, nada menos que Sua Glória, nada menos que o imenso peso de Seu Esplendor!


[1] Homilia feita com base em textos de Christine Fontaine em http://www.dieumaintenant.com.

Amém!

Após a comunhão

Caros irmãos e irmãs, desde o início da quarentena na Itália, quando a missa no Vaticano era celebrada sem a participação dos fiéis, o Papa Francisco sempre convidava àqueles que não podiam comungar sacramentalmente a fazer a Comunhão espiritual com a seguinte oração:

Meu Jesus, eu creio que estais presente no Santíssimo Sacramento do Altar. Amo-vos sobre todas as coisas, e minha alma suspira por Vós. Mas, como não posso receber-Vos agora no Santíssimo Sacramento, vinde, ao menos espiritualmente, a meu coração. Abraço-me convosco como se já estivésseis comigo: uno-me Convosco inteiramente. Ah! não permitais que torne a separar-me de Vós!

Papa Francisco
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