Homilia para o XXXII Domingo do Tempo Comum – A,
proferida a 8 de novembro de 2020
por Dom Martinho do Carmo OSB

Sb 6,12-16; Sl 62; 1Ts 4,13-18; Mt 25,1-13

Introdução

As leituras dominicais deste mês de novembro estão todas orientadas para o nosso reencontro com Deus que acontecerá por meio da Graça recebida em Cristo Jesus e por meio da responsabilidade que cabe a cada um de nós nesta caminhada em vista de nossa participação na vida do Reino de Deus, no dia em que ele vier para nos chamar a unir-nos a Ele.

Hoje, na parábola das dez jovens, Jesus nos oferece uma reflexão sobre a vigilância que deve ser a atitude espiritual fundamental de cada fiel que se prepara para o banquete das bodas eternas.

Homilia

Caros irmãos e irmãs, não vos parece estranho? Que história é essa de um noivo que chega no meio da noite!? Talvez possamos começar relembrando um pouco de como era um casamento judeu na época de Jesus, para entender essa parábola, para entender o que Jesus quer nos dizer aqui. O casamento judeu ocorre em duas etapas: primeiro, há a conclusão daquilo que poderíamos chamar de aspecto “jurídico” do casamento. Quando as duas famílias chegam a um acordo, quando o noivo e a noiva aceitam comprometer-se, e assinam, então, o contrato de casamento e trocam-se os presentes em sinal do compromisso assumido. A partir daí, eles já estão totalmente comprometidos um com o outro, mas a vida comum não começa imediatamente: eles ainda vivem separados por alguns meses. É por isso que chamamos esse primeiro passo de “noivado”, mas não o noivado que conhecemos em nossa sociedade, porque, ao contrário do que acontece em nossos dias, aqui já existe um real compromisso para a vida.

Os noivos ficam então comprometidos um com o outro por toda a vida, mas, ainda não se unem, porque para isso é preciso estarem prontos. Para isso, o noivo irá preparar um lugar onde o novo lar possa se estabelecer. Ele vai, por exemplo, construir uma casa e também providenciar o que for necessário para atender às necessidades de sua noiva e as próprias (um fogão, uma máquina de lavar, uma forma de bolo…). A noiva vai preparar seu enxoval. E, um e outro irão, acima de tudo, preparar seus corações para esta união. Então, quando tudo estiver pronto, pode-se dar o segundo passo: a conclusão do que podemos chamar de casamento “efetivo”, ou o início da vida conjugal. E é neste momento, no meio da noite, que o noivo chegou. Quando ele é anunciado, ao grito de “O noivo está chegando. Ide ao seu encontro!”, a noiva vai embelezar-se, e todo o vilarejo preparará a festa e o noivo será conduzido pelas amigas da noiva, que o aguardam com suas lâmpadas acessas, até o salão nupcial onde os noivos são entregues um ao outro e abençoados.

Mas o que isso significa para nós? Ora, o noivo que vem é o Cristo Jesus, aquele que, no sangue da sua oferta na Cruz, assinou o contrato de casamento com a humanidade. Ele já é o Esposo de nossas almas, mas a união com ele ainda não está totalmente consumada; estamos justamente neste entretempos: nós já conhecemos o seu amor – pois Ele já nos deu prova disso, com os dons de sua graça –, mas aguardamos algo melhor: esperamos ser plenamente unidos a ele. Assim, não somos apenas como as amigas da noiva que se regozijam por sua chegada, mas também temos nossas almas desposadas por Deus e aguardamos sermos inteiramente unidos a Ele.

Este estado de espera é uma das características deste tempo em que vivemos, entre a morte de Cristo e seu retorno glorioso. Estamos, de certa forma, “no meio da noite” onde é preciso que a lâmpada da vida cristã seja alimentada com o óleo das graças divinas: os Sacramentos constantemente recebidos, a meditação cotidiana da Palavra de Deus, os esforços que fazemos para crescermos em virtude, os atos de amor para com o próximo… eis o que constitui este óleo que precisamos reabastecer incessantemente, repetindo incansavelmente os mesmos atos de rezar, amar e servir, pois sempre temos necessidade de conhecer melhor a Deus. Eis o que significa vigiar para estar pronto, qualquer que seja o momento em que Jesus se apresentar: se eu o estou procurando por meio de minha oração e ações, o grito “O noivo está chegando!”  vai encontrar-me pronto, faltando apenas os últimos retoques no penteado, ou na gravata borboleta para finalmente participarmos desta festa de casamento. E o que dizer das jovens imprevidentes? Elas também foram iniciadas na vida cristã, e fizeram boas obras porque têm uma lâmpada que pode brilhar. Sem dúvida elas rezam; sem dúvida elas vez ou outra leem a Bíblia, ou pelo menos ouvem a homilia quando vão à missa; sem dúvida elas sabem da necessidade de se servir seu próximo, e praticam isso. Mas é de forma intermitente, casual, esporádica, instável. Não é isso que sustenta e motiva a sua vida. Não há uma entrega de amor. É como se elas estivessem “se reservando”. É o cristão que diz a si mesmo que quando chegar a hora, quando o noivo chegar, ele saberá o que fazer. Pensa que não há necessidade de converter-se agora, e que o que importa será converter-se no momento certo, quando Jesus voltar, ou quando ele estiver já no fim de sua vida… E, de certa forma, as jovens imprevidentes da parábola dependem do óleo de outros. Em vez de tentar meditar por conta própria, elas lerão ou ouvirão apenas as meditações de outras pessoas. Em vez de se converter, eles se contentarão em ouvir belos testemunhos de conversões e belas obras de caridade de outras pessoas.

Caros irmãos e irmãs, isso é o que Jesus quer que evitemos a todo custo! O que ele quer é que vivamos nossa vida cristã por conta própria e sem reservas, que não nos contentemos apenas com o mínimo necessário, mas “madruguemos” em busca da Sabedoria de Deus (cf. Sb 6,14), Ele quer que “desde a aurora” ansiosos o busquemos com a alma sedenta, conscientes de que “seu amor vale mais do que a vida” (cf. Sl 62). Cristo aguarda para nos fazer entrar no salão nupcial, onde não seremos mais meros convidados para o casamento, mas que será com nossa própria alma que ele irá desposar.

Amém!


Após a comunhão

Caros irmãos e irmãs, desde o início da quarentena na Itália, quando a missa no Vaticano era celebrada sem a participação dos fiéis, o Papa Francisco sempre convidava àqueles que não podiam comungar sacramentalmente a fazer a Comunhão espiritual com a seguinte oração:

Meu Jesus, eu creio que estais presente no Santíssimo Sacramento do Altar. Amo-vos sobre todas as coisas, e minha alma suspira por Vós. Mas, como não posso receber-Vos agora no Santíssimo Sacramento, vinde, ao menos espiritualmente, a meu coração. Abraço-me convosco como se já estivésseis comigo: uno-me Convosco inteiramente. Ah! não permitais que torne a separar-me de Vós!

Papa Francisco

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