V DOMINGO DO TC – B (Mc 1,29-39)

D. Paulo DOMICIANO, OSB

Depois de libertar o homem possesso, como ouvimos no último domingo, Jesus sai da sinagoga e vai à casa de Simão e André, onde encontra a sogra de Simão de cama, com febre. Mas por que Marcos nos conta esta episódio aparentemente tão banal? Afinal, uma mulher com febre não parece algo tão grave que merecesse a atenção do evangelista.

A febre, como sabemos, não é uma doença, mas sinal ou sintoma da doença. Segundo a Lei judaica a febre era considerada um castigo para quem fosse infiel à Aliança (cf. Lv 26,16; Dt 28,22). Neste caso, esta mulher vive em uma situação de infidelidade, que a paralisa – ela estava de cama, como nos indica o Evangelho. Se tem febre, qual seria a sua doença, afinal? Quando Jesus cura um cego, ele começa a ver; quando cura um paralítico, ele começa a andar; aqui, Jesus cura a mulher e ela começa a servir todos. Poderíamos concluir que a doença desta mulher, paralisada na cama, era a impossibilidade de sair de si, de relacionar-se com os outros, servindo com liberdade.

Jesus não diz nenhuma palavra que possa provocar a cura, mas simplesmente “se aproximou, segurou sua mão e ajudou-a a levantar-se”, ou seja, Ele rompe o isolamento em que ela vivia e a resgata. Sabemos que o processo de cura na vida de qualquer pessoa começa quando alguém se faz próximo. A simples presença solidária de alguém, quando se está doente, já é um alívio. Assim, a proximidade da presença de Jesus, sua mão estendida, tiram aquela mulher de seu isolamento, de sua prostração, e a colocam de pé, restituindo-lhe a vida.

Aqui já podemos antever os sinais da força da ressurreição de Jesus. O verbo “levantar” aqui utilizado, que em sua raiz significa “despertar”, é o mesmo utilizado pelo evangelista para falar da ressurreição de Jesus, que se levanta da morte. Assim, esta cura já está inserida na dinâmica pascal e tem um valor exemplar, pois nos indica a origem de todas as curas que Jesus realizará, ou seja, a sua Páscoa, a vitória da vida sobre a morte.

“Então, a febre desapareceu; e ela começou a servi-los”. A cura conduz ao serviço, como expressão de gratidão e de disponibilidade; este serviço (diaconia) que assinala toda a existência cristã, que tem por modelo o próprio Jesus, que se fez servo de todos. Isso nos ajuda a compreender que o serviço na vida do cristão nasce da liberdade recebida; não é peso, não é obrigação, mas liberdade. Nós, que recebemos tanto de Deus, que o temos próximo de nós, nos dispomos também ao serviço gratuito e desinteressado? Somos servidores de Cristo e de nossos irmãos porque fomos renovados por Ele.

O que nos toca neste episódio é a sua simplicidade: este cenário doméstico, comum a todos nós (quem nunca teve um doente em casa ou nunca esteve de cama?) e o gesto simples e sincero de Jesus. Isso nos revela que o Sagrado não pode estar somente lá na sinagoga, no templo, ou na igreja, mas precisa penetrar em nossas casas, em nossa vida ordinária de cada dia. É a presença de Jesus que faz de qualquer lugar um lugar sagrado, onde a vida pode se manifestar. “Ele se aproximou” da sogra de Simão, se aproximou de cada um de nós, veio habitar conosco, se fez Emanuel, assumindo nossa vida em sua vida para transformá-la.

“À tarde, depois do pôr do sol, levaram a Jesus todos os doentes e os possuídos pelo demônio. A cidade inteira se reuniu em frente da casa”. Passamos do encontro de Jesus com uma pessoa ao encontro com uma multidão de enfermos e necessitados. Todos têm espaço diante de Jesus. Quem dera que “todos” os habitantes de nossa cidade também se dessem conta de que somente diante da porta de Cristo existe salvação, existe vida nova e verdadeira… De sua parte, é a mesma atenção e a mesma proximidade para com todos, a mesma força de vida nova que o move. Contudo, o evangelista nos faz notar onde Jesus busca forças para estar sempre disponível e atento ao outro: “De madrugada, quando ainda estava escuro, Jesus se levantou e foi rezar num lugar deserto”. Não se trata de um detalhe irrelevante… Sem este recuo, sem o silêncio e a solidão da oração nada se faz; tudo não passaria de ativismo vazio. É em sua relação filial com o Pai que Jesus encontra o sentido e a fonte de sua vocação e de toda a sua atividade.

Peçamos ao Senhor esta mesma disponibilidade de Jesus de estarmos próximos de quem precisa de nós, saindo da febre de nosso comodismo, de nossos egoísmos e individualismos, e colocando-nos à serviço do outro. Para isso, precisamos também buscar na oração, no silêncio do encontro com Deus, a fonte para nosso agir, conscientes que sem Ele nada somos e nada podemos.

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