HOMILIA DE NATAL – MISSA DA NOITE (Jo 1,1-18)
D. Paulo DOMICIANO, OSB
A liturgia desta noite santa nos reúne aqui para contemplarmos esta família singular, poderíamos mesmo dizer, fora do padrão, onde temos uma mãe solteira, Maria, que espera que seu marido, José, a reconheça como tal, segundo a lei e dê um nome a seu filho. Sem lugar para hospedarem-se em Belém, ela dá à luz o recém-nascido em uma manjedoura, em uma gruta destina aos animais, como clandestinos. Contudo, essa criança nasce como cada um de nós nasce: não realiza milagres, nem ocorrem eventos extraordinários ao seu redor; ela chora, sente fome e frio, é envolvida em panos e precisa do colo de sua mãe.
E aqui, como cristãos, silenciamos e adoramos, porque cremos que essa criança é Deus, nosso Deus, que se fez homem como nós, que se fez Emanuel, Deus-conosco, solidário em tudo conosco, assumindo nossa precariedade, desde a concepção até a morte. Esta é a boa notícia, o Evangelho que o anjo anuncia como “grande alegria para todo o povo” (cf Lc 2,10). Este é o coração da nossa fé cristã, uma fé que não pode competir com as religiões e seus deuses, porque o que ela proclama é o inédito: um Deus-homem, carne mortal, um Deus que não se limitou a cuidar de nós, mas nos amou a ponto de querer ser um de nós, na partilha real e radical do que somos.
O modo como Deus se encarna para vir habitar entre nós também é surpreendente. Ele não vem revestido de poder e majestade, mas envolto em humildade, na simplicidade de uma história cujos protagonistas são homens e mulheres pobres, que não se destacam nem têm grandes papéis na história. Deus veio entre nós “esvaziando-se” de sua condição divina, se rebaixando a ponto de ocupar o último lugar entre nós, aquele lugar de escravo (cf. Fl 2,5-8).
O cristianismo está todo aqui, nesta contemplação de um Deus feito pobreza, de um Eterno feito mortal, de um Todo-Poderoso feito criança, de um três vezes Santo que se tornou terreno, mortal. Ele se fez um de nós, um entre nós, um conosco. E tudo isso, por amor! Um amor que vai até as últimas consequências, que não mede esforços nem se economiza.
Desde aquela noite, não se pode mais dizer Deus sem acrescentar a palavra homem, porque Jesus é o Deus-homem, porque nossa mortalidade entrou em Deus e a vida de Deus entrou em nós. O Natal é o nascimento de Jesus – Ele nasce para os homens – mas também é o nosso nascimento, pois, nesta noite, nascemos para Deus.
Mas diante deste grande anúncio de amor, que se revela e se doa em Jesus Cristo, nascido em Belém, quem o reconhece? Quem o acolhe? Ele chega até nós nesta noite, mas nosso mundo permanece indiferente à sua presença. Portanto, como os simples pastores, como Maria e José, sejamos estes que o acolhem a Boa-nova da alegrai em nossos corações e em nossos lares, pois, “a todos que o receberam, deu-lhes a capacidade de se tornarem filhos de Deus, isto é, aos que acreditaram em seu nome” (cf. Jo 1,12).