HOMILIA DO XXVI DOMINGO DO TEMPO COMUM (Lc 16,19-31)

D. Afonso VIEIRA, OSB
Irmãos e irmãs, no Evangelho de hoje, Jesus, através da parábola do homem rico e do pobre Lázaro, nos diz que é uma má opção colocar nossa esperança e fortaleza no dinheiro, no bem-estar, no conforto e em interesses egoístas. Quem se preocupa apenas em gozar a vida e fica indiferente ao sofrimento dos irmãos, falha completamente o sentido da existência. Perceberá, quando fizer as contas finais, que a sua vida não valeu para nada. Já o profeta Amós denunciava violentamente o egoísmo dos ricos e poderosos, agarrados a uma vida de luxo e esbanjamento, indiferentes à sorte dos pequenos e dos pobres. O profeta avisa que Deus não está disposto a suportar uma situação que ignora a busca da irmandade e o bem estar de todos os homens. A profecia de Amós mostra que se Israel insistir em continuar nesse caminho, irá sofrer as consequências das suas escolhas egoístas.
O Texto do Evangelho nos mostra dois homens. Dois mundos. Duas vidas opostas. Na primeira, a de um homem rico vestido de púrpura e linho fino, que é reservado aos reis e a Deus. As vestes deste rico eram brilhantes e harmoniosas. E este rico festejava diariamente. Era uma vida de luxo e prazer. Mas este rico não tinha nome. De outro lado, temos um pobre, literalmente jogado no portão do rico. Ele não tem casa. A sua pele está coberta de úlceras. E ele gostaria muito de saciar sua fome com o que caía da mesa do rico. A sua companhia: cães que lambem as suas úlceras. Este pobre se chama “Lázaro”, que significa “Deus vem em auxílio”. Tem um abismo entre estes dois homens. Estatuto social, aspeto físico, gênero e contexto de vida. Mas todos nós morremos. A morte nos coloca em pé de igualdade. Lázaro morre e os anjos levam-no para junto de Abraão. O rico também morre, é enterrado. Novamente, duas situações contrastantes. Lázaro encontra consolo e o rico encontra sede e sofrimento num forno ardente. Um abismo intransponível os separa. No entanto, ambos podem se ver, a ponto de o rico reconhecer Lázaro de longe e, para surpresa de todos, chamá-lo pelo nome. Ele sabe o nome dele, ele conhece Lázaro. Ele via o homem a sua volta. Aquele pobre não era um desconhecido, era só ignorado por ele!
O que aconteceu com esse rico que, durante a sua vida, nunca chamou Lázaro pelo nome, nunca olhou para ele? Parece que o rico ficou preso nas seduções deste mundo passageiro. A sedução do luxo, da boa mesa, dos prazeres. Ele se confundiu com as suas riquezas a ponto de se tornar surdo à palavra de Deus e fechava os olhos ao pobre Lázaro à sua porta. Deslumbrado pelo brilho das aparências, do seu estado social, se deixou encerrar numa falsa segurança, numa ilusão enganadora; a tal ponto que este homem não tem nome. Este rico acreditava não ter nada em comum com o pobre Lázaro, nem em termos de humanidade, nem de solidariedade, nem de destino. Mas o pobre tinha um nome; e o rico, como se chama? Perante Deus, esse rico se encontra sedento, com um vazio diante de si. E, no entanto, no abismo em que se encontra, vê Lázaro. Por que não o viu quando ainda estava neste mundo? Por que não o socorreu quando ele estava na sua porta? Por que não lhe dirigiu um simples olhar, uma palavra, uma mão estendida?
Muitas vezes o mais difícil para o mais pobre, doente ou necessitado de algo, é o não serem vistos. Ninguém lhes dirigir o olhar. Talvez o nosso abismo seja esse: um apego desordenado a bens passageiros que deslumbram os olhos a ponto de cegar o coração fazendo com que nos esqueçamos do irmão ao nosso lado. As riquezas não são boas nem más em si mesmas. Mas tornam-se más quando nos desviam, como o rico da parábola, da solidariedade com quem precisa, endurecem o nosso coração a ponto de esquecermos os homens e Deus e perdermos o nosso nome diante dele. Existem formas de apego neste mundo que nos prendem e nos alienam, enquanto um simples gesto de humanidade, um olhar, um sorriso, uma palavra libertam as sementes do evangelho, suavizam os sofrimentos e trazem um pouco de humanidade.
Irmãos e irmãs, não pensemos que somos tão ricos que não temos nada a dar a quem pede algo, nem nada a receber d outro. Não pensemos também que não há em nós um pobre adormecido, que às vezes espera um mínimo de atenção fraterna. Seremos sempre o pobre de um mais rico ou o rico de um mais pobre. Abramos os olhos para as nossas riquezas e pobreza mútuas, não para cavar abismos entre nós, mas para construir pontes que nos unam pela nossa comum humanidade e precariedade, pois “Ninguém é tão pobre que não tenha nada para dar, ninguém é tão rico que não tenha nada para receber”. O “homem de Deus” está em contraste total com o homem egoísta, apegado aos bens materiais, ambicioso e injusto de que falam a Primeira Leitura e o Evangelho. O “homem de Deus” é aquele que, correspondendo aos compromissos que assumiu no momento do seu batismo, se torna um sinal vivo de Deus no meio dos seus irmãos.
O único digno de títulos e de receber culto “o venturoso e único soberano, o Rei dos reis e Senhor dos senhores, o único que possui a imortalidade e habita uma luz inacessível, aquele que nenhum homem viu nem pode ver”. Só a Ele a honra e o poder eterno. Amen.

Categories: Homilias