4º Domingo do Advento (Mt 1,18-24)
D. Agostinho FAGUNDES, OSB
Meus caros irmãos em Cristo,
a liturgia deste IV Domingo do Advento nos coloca diante das figuras de José e Maria e como eles
souberam acolher o mistério do Deus Vivo que se faz para habitar em nosso meio. É preciso ter fé e coragem
para acolher o desígnio de Deus em nossas vidas.
O Evangelho de Mateus quer nos revelar a origem divina de Jesus Cristo – foi o próprio Espírito Santo
quem agiu em Maria. Ou seja, desde a sua geração no ventre da virgem, a vida do Cristo está marcada pela força
do Espírito. E observemos atentamente o que nos afirma Paulo no início de sua carta à comunidade de Roma:
foi o “[…] Espírito de Santidade que o ressuscitou dos mortos”. O Espírito Santo de Deus é o poder de Deus
agindo em Jesus Cristo, do início ao fim de sua vida.
Mas retornemos ao texto de Mateus. Ele nos diz que José era um homem justo e, assim, decide abandonar
Maria sem a expor. Sua atitude nos recorda as palavras do salmista: “Porque jamais vacilará o homem reto, sua
lembrança permanece eternamente! Ele não teme receber notícias más: confiando em Deus, seu coração está
seguro. Seu coração está tranquilo e nada teme” (Sl 111,6-8). Enquanto José assim age, Deus, que “[…] sonda
todos os corações e penetra todos os desígnios do espírito” (1 Cr 28,9), se manifesta a ele por meio de Seu Anjo.
José, tal como Jacó (Gn 31,11) ou como Salomão (1 Rs 3,5), escuta a Deus em seu sonho, chamando-o pelo
nome: “José, filho de Davi”. Mais tarde, esse epíteto – “filho de Davi” – será aplicado ao próprio Cristo. No
mesmo instante em que é chamado por Deus, também ali recebe sua vocação: ele acolherá em sua casa Maria e
o menino, e assumirá esse como seu filho, dando-lhe o nome de Jesus – pois quando um homem dava um nome
a uma criança significava que ele assumia legalmente a sua paternidade. E José faz exatamente tudo conforme
lhe foi revelado.
Na figura de José, de algum modo vemos refletida a figura de Nóe, “[…] um homem justo, íntegro entre
seus contemporâneos, e [que] andava com Deus (Gên 6,9), ao qual foi dada a missão de salvar sua família das
águas do dilúvio por meio da construção de uma arca. E ele “[…] fez tudo o que Deus lhe ordenara” (Gên 7,5).
Lembremos que esse relato do livro do Gênesis fala exatamente de um novo começo para a humanidade.
Também o nome Jesus – que significa Deus salva –, na língua hebraica, é uma forma abreviada do nome Josué
– uma outra figura bíblica muito importante, pois ele foi o responsável por entrar com o povo na terra prometida
(Jos 3). Assim, esse curto relato da origem divina de Jesus Cristo – mas que também evidencia que ele “[…] é
descendente de Davi segundo a carne, como ouvimos na segunda leitura – já aponta para a sua missão
“recriadora” da humanidade, a qual ficará evidente por meio de seus ensinamentos e ações.
Dessa forma, o Evangelho de hoje nos mostra o maravilhoso desígnio de Deus que está se realizando. A
promessa de Deus feita por meio do profeta Isaías a Acaz (rei de Judá entre 736 e 716 a.C.) está se cumprindo
em Jesus Cristo. Essa criança é o Emanuel, que chega trazendo salvação para os homens.
Somos todos convidados, tal como a Virgem Maria, tal como São José, a acolhermos o Mistério de Deus
e de Seu Amor. Por isso cantamos no salmo de hoje: “O rei da glória é o Senhor onipotente; abri as portas para
que ele possa entrar”! Ou seja, a liturgia nos convoca a fazer espaço em nosso coração, em nossa vida para que
o Menino Deus possa habitar–nos, fazer morada em nós.
Terminemos nossa reflexão meditando nas palavras de autor anônimo que foi recolhido na Patrologia
Grega: “‘Maria, sua mãe, estava prometida em casamento a José, e antes de viverem juntos, descobriu que estava
grávida pelo Espírito Santo.’” Visto que, no futuro, todos os santos nasceriam da Virgem Igreja, a esposa de
Cristo, o próprio Cristo nasceu de uma virgem prometida em casamento; para que o nascimento dos servos não
excedesse em dignidade o do Senhor. E para que os filhos imitassem em tudo o exemplo perfeito do nascimento
paterno, Maria também foi prometida em casamento a um carpinteiro, porque Cristo, o esposo da Igreja,
também haveria de realizar toda a sua obra de salvação da humanidade por meio da árvore da cruz.”
(ANÔNIMO, Obra Incompleta sobre o Evangelho de Mateus, 1).