HOMILIA DO XXV Domingo Tempo Comum – Ano C (Lc 16,1-13)

Dom Paulo DOMICIANO, OSB

O capítulo 16 de São Lucas nos apresenta duas parábolas que têm como tema comum o uso dos bens. A primeira delas, do patrão e do administrador, que acabamos de ouvir, e a outra, sobre o rico e o pobre Lázaro, que ouviremos no próximo domingo.

Nem sempre as parábolas são tão fáceis de serem compreendidas e às vezes podem até soar desconcertantes, como é o caso desta que ouvimos hoje. Nela, se diz que o administrador é claramente desonesto, mas ao final, o patrão o elogia, e Jesus o apresenta como um modelo. Como compreender esta palavra sem se escandalizar? Sem dúvida, alguns trechos das Escrituras e do próprio Evangelho pedem de nós um exercício intelectual e espiritual mais profundo para podermos colher a “Boa Nova” nelas contida. E é isso o que esta parábola nos pede hoje.

O protagonista desta parábola é um administrador astuto e desonesto de um homem rico. Tendo sido descoberto, por esbanjar os bens de seu patrão, ele está prestes a ser demitido. Se desenha, portanto, um cenário de emergência na vida deste homem: ele perderá tudo aquilo que lhe dava uma aparente segurança de vida.

“A questão fundamental é colocar-nos diante da reflexão sobre o cuidado com a vida, com os bens pessoais, com o tempo e com nossas posses. Tudo em nossa vida é um dom que não nos pertence. Ninguém pode dizer que possui realmente alguma coisa ou que é o dono de algo ou de alguém. Tudo pode ser tirado de nós a qualquer momento: relacionamentos, afetos, funções, saúde, posses e a própria vida. Seguimos na ilusão de sermos os donos dos dons. No entanto, devemos entender que somos apenas seus administradores”.  

Diante desse momento de crise, o administrador não procura se defender, não foge, nem se deixa abater. Ela para e reflete: “Que vou fazer?” Esta questão aparece como o centro do Evangelho; é o momento decisivo de mudança, semelhante ao que aconteceu com o filho pródigo, que caindo em si também se perguntou “Que vou fazer?” e se decidiu voltar para a casa paterna. “Que vou fazer?” Ele não nega a realidade e nem foge dela. Com lucidez, ele olha para si mesmo, se pergunta o que pode fazer, reconhece seus próprios limites, incapacidades e impotências e, somente depois, age de modo pragmático e inteligente.

Com astúcia e criatividade ele consegue contemplar uma saída para o futuro. Por isso, a parábola não está focalizada sobre a desonestidade, mas sobre a astúcia, a inteligência e a criatividade do administrador. É isto que é elogiado pelo patrão e, consequentemente, por Jesus, que deseja que seus discípulos mostrem a mesma prontidão, lucidez e inteligência ao serviço do Evangelho.

O administrador escolhe o caminho da generosidade e cria um futuro para si usando sua vida para perdoar as dívidas que outros tinham contraído. Lembremos que esta parábola segue imediatamente as três parábolas da misericórdia, no cap. 15 de Lucas, que nos introduzem nessa nova lógica proposta por Jesus. Não é simplesmente a justiça a primeira lei do Evangelho, mas a misericórdia e a generosidade. O administrador desonesto é elogiado não por sua justiça (ou injustiça), mas porque escolheu o caminho da generosidade.

“Ele foi astuto porque foi capaz de inverter a visão do dinheiro como instrumento de acumulação pessoal, egocêntrico e solitário, para uma oportunidade de criar e construir novas relações baseadas no tesouro da gratidão com aqueles com quem tinha apenas relações comerciais. Seus movimentos vão do fechamento à abertura, do ganho ao dom, da solidão à comunhão.”

O Evangelho nos impele a nos fazermos a mesma pergunta: “Que farei agora?”. Diante de nossas faltas e fracassos, Jesus assegura-nos que há sempre tempo para curar o mal praticado com o bem. Não basta reclamar das situações e dos males do nosso tempo. É preciso verificar, pensar, inventar e imaginar passos concretos. Diante de nossas dificuldades, interiores ou exteriores, pessoais, familiares, sociais, qual a nossa atitude? Deixamo-nos vencer passivamente, nos desesperamos, nos alienamos, como se o problema não fosse nosso? Ou procuramos agir com criatividade? Jesus deseja que nós, filhos da luz, tenhamos a capacidade de agir com inteligência e astúcia. Temos a nosso dispor as riquezas que nos foram confiadas para agir bem, para transformar o nosso meio; não somente os bens materiais evocados pelo Evangelho de hoje, mas todas as nossas riquezas, dons, capacidades. É com esse patrimônio que nos foi confiado que devemos construir um mundo novo e abrir passagem para a nossa entrada no Reino dos Céus.

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